sexta-feira, 20 de março de 2015

"Bolha de filtro" e Subjetividade

Com a extensa diversidade de conteúdo informativo disponível ao nosso acesso, a tarefa de selecionar qual informação é a mais adequada para consumirmos se tornou mais difícil. Se por um lado todo esse acervo, de fácil acessibilidade, nos permite uma amplitude maior para adquirir conhecimento, por outro, é necessário um poder de seleção muito grande para saber o que vale ou não a pena ser absorvido.  O exemplo mais fiel a tal situação é a Internet. Há não muito tempo, o hipertexto era uma ferramenta totalmente aberta - e ainda o é - , uma "terra" livre "trilhas" em que dependia somente do nosso senso de pesquisa. Bastava dar um simples clique que, de repente, pulávamos de conteúdo para conteúdo sem qualquer lógica existente entre os mesmos. Porém, nos últimos anos, a navegação passou a ser muito mais centralizadora do que dispersa. Diversas redes sociais e plataformas de pesquisa, como a Google, o Facebook, o Yahoo e a Microsoft formam uma espécie de "condomínio" em que seus usuários raramente costuma se distanciar.

Explicando de uma forma geral, tais ferramentas criam uma hierarquia de conteúdo, selecionando para você, usuário, com aquilo que é considerado mais pertinente. Isso acontece ao entregarmos nossos dados para essas empresas - cadastro no Facebook, por exemplo -, permitindo que nossa experiência na web seja personalizada. Este fenômeno é o que muitos chamam de "ditadura do algorítimo": uma ilusão de livre-arbítrio foi criada pelas máquinas, fazendo com que nós acreditemos que o conteúdo que encontramos na internet foi consequência do acaso, quando na verdade fomos guiados até ele. 

Analisando de uma forma superficial, podemos até dizer que essa personalização de conteúdo é uma vantagem, um guia. Porém, ao dissecarmos a situação, nos concentrarmos nas camadas mais profundas, vemos que não é bem assim. O problema central está no conjunto, no resultado final da ação. Se considerarmos esses filtros como um todo obtemos o efeito chamado "bolha de filtro". A sua bolha é seu universo. O conteúdo existente nela é, de acordo com essa lógica de seleção, o único em que terá interesse em consumir. Tudo o que está fora dela é, teoricamente, irrelevante para você. Perdemos, então, a chance de escolher qual tipo de informação vamos consumir. 

Logo, sua bolha de filtro - dependendo do conteúdo existente nela -, aos poucos vai moldando quem você é e o que você faz. Hoje, a constituição do ser humano está diretamente ligada às relações com as coisas. Estamos sendo construídos artificialmente, concentramos nossas experiências nos objetos ao nosso redor. Os aplicativos, por exemplo, são intermediários, tradutores da nossa comunicação com o mundo. Contudo, a tecnologia não só prolonga o homem como também o constitui. E é através dessa relação que modificamos nossa percepção de mundo. 

Com a chagada do Smartphone, essa relação mudou um pouco mais. Um único aparelho concentrou as funções de vários outros, que costumávamos ter um contato singular, em um só objeto. O novo e prático aparelho se tornou, então, essencial para nossa "sobrevivência", justificados pela busca ao novo (UNICAMP, 2014). Nosso vínculo com todos os outros objetos mudou muito. Passamos a usar alguns esporadicamente ou simplesmente o descartamos. 

Não entenda mal, a tecnologia atual é uma das maravilhas modernas que facilita o nosso cotidiano em diversos níveis. É de uma praticidade imensa possuir despertador, agenda, calculadora, TV, câmera, dicionário, mapas  disponíveis em um único aparelho ao alcance das mãos e gratuito. O perigo mora, contudo, na dependência tecnológica. Se você perde seu aparelho, você perde não só informações importantes, como também suas memórias e, então, sua subjetividade.

Fontes:
"Serendipidade: encontros com o acaso" TORRES, Bolívar.
"Estudo da Dependência Tecnológica de Jovens Universitários" NAGATA, Erick Tekeo; SCHELTINGA, Priscila Strasser; DE JESUS, Alan Rodolfo; DA VEIGA, Yuri Schiavon - UNICAMP.
Vídeo "Bolha de Filtro", Eliparisier.