sexta-feira, 27 de março de 2015

A nossa relação com a Técnica, Tecnologia e Comunicação


Afinal, o que seria técnica, tecnologia e comunicação? A verdade é que não há três elementos separados, eles se misturam. A realidade é, e sempre foi, híbrida. É a modernidade que tenta purificar essa hibridização definindo conceitos distintos para cada um desses elementos. Para entender melhor o tema, no entanto, vamos passar por esses conceitos.

A palavra técnica vem do grego “techné” e significa arte. É o saber fazer prático com uma finalidade. O que na maioria das vezes se concretiza em um objeto, mas isso não é regra. Do artesanato e da culinária até armas de destruição. Tudo isso é técnica. Aplicativos, então, não fogem disso. São o desenvolvimento dessa techné e a junção de varias delas em um artefato multitarefas (o que se configura em uma tecnologia, como veremos a seguir). Quando o Homo Erectus descobriu que produziria fogo com a fricção de duas pedras, fazer fogo – que até então era um saber fazer inerente à natureza - se tornou uma técnica.

Ora, o mundo sempre foi técnico, mas essa técnica de que falamos não está na natureza. A natureza já tem o seu fazer técnico, a que Platão e Aristóteles deram o nome de AUTOPOIETICA. Para os filósofos, a técnica é inferior à natureza e à contemplação (saber ver, filosofar). A techné que nos referimos é a técnica que o homem imita da natureza (POIÉTICA).

Tecnologia vem a ser, portanto, a filosofia da técnica. O fruto da relação da técnica com a ciência. Com o surgimento da tecnociência, o termo acabou virando sinônimo de aparato tecnológico, o que é um equivoco. Tecnologia é a união de técnicas e elementos que não têm um princípio em comum em um aparelho tecnológico que é de utilidade e tem alguma função para a sociedade. Um smartphone – e seus aplicativos, por exemplo, reúne princípios heterogêneos em um só artefato.

Esses artefatos tecnológicos e híbridos que vão guiar o destino do homem no mundo. O mais importante é entender a nossa relação com essa tecnologia. É do senso comum dizer que os aplicativos e a internet são os responsáveis por nos tornarmos mais superficiais, por exemplo. Segundo Pierre Levy, filósofo francês da cultura virtual contemporânea, é um equivoco falar na tecnologia como modificadora de determinada cultura. O que há é o ser humano que inventa, produz, utiliza e interpreta as técnicas. Levy, em seu texto “O inexistente impacto da tecnologia”, afirma que ela é produto de uma sociedade e de uma cultura, portanto, incapazes de, só pela condição de existência, modificar nada. A tecnologia não se constitui como uma entidade passiva, real e dissociada da cultura. Nada é puramente técnico, tudo está contextualizado, portanto, dentro de uma rede sócio-tecnica. É um erro culpabilizar a tecnologia pelo uso que fazemos dela. Em agosto do ano passado, por exemplo, o aplicativo Secret foi banido das lojas virtuais e seu uso proibido por ordem da Justiça brasileira devido às inúmeras queixas de cyberbullying estimulados pelo “anonimato”. O Google entrou com recurso alegando que a empresa autora do Secret não poderia responsabilizar-se pelas ações dos usuários e em outubro do mesmo mês a proibição foi suspensa.

O que muda, então, em diferentes sociedades não é o impacto da tecnologia, mas a qualidade e a intensidade da relação dela com o homem. O que diferencia a nossa relação com o mundo ao escrever uma mensagem usando graveto e areia ou usando caneta e papel já que ambas são técnicas que levam a um mesmo objetivo? Martin Heidegger chegou a pensar a respeito dessa relação em “A questão da Técnica”. A diferença é que na primeira há um diálogo com a natureza que se perde na segunda. A caneta já é um objeto idealizado, matematizado, fruto de uma técnica pré-concebida. No uso da caneta, nos privamos do “saber fazer” técnico, da tentativa e do erro. Ou seja, “não se trata de avaliar os ''impactos'', mas de descobrir o irreversível a que tais usos nos conduziriam, as ocasiões que ela nos permitiria lançar mão e formular os projetos que explorariam as virtualidades de que ela é portadora, de decidir o que faremos com ela” (LEVY, P).

É preciso voltar ao Séc. XX para entender melhor essa relação que temos com a tecnologia. Até então tinha uma fissura entre o que era comunicação e o que era tecnologia. A explosão das tecnocomunicações foi o “start” para o desaparecimento dessa fissura. Hoje, quando falamos em tecnologia, vinculamos imediatamente à comunicação. E não é para menos, comunicação deriva do latim e significa participar algo, sair do isolamento. Ora, vivemos para transmitir o saber e a tecnologia se tornou a mais eficiente ferramenta de integração e troca mútua. Ela dribla o constrangimento do espaço e do tempo e amplia o processo de adquirir informação de lugares diversos.

É senso comum a ideia de que a internet acaba isolando as pessoas, mas podemos ver que o que acontece o contrário. Com os aumentos historicamente evidentes da artificialização, da informação e da liberdade de escolha dessa informação, estamos ampliando as possibilidades romper esse isolamento. Mesmo os aplicativos móveis programados inicialmente para realizar funções fora do nível social são utilizados como ferramenta de apoio para estabelecer essas relações. Como um Leitor de Código QR utilizado em campanha publicitária para facilitar interações entre os clientes de um bar em Cingapura.

Toda mídia visa romper o isolamento. Isso sim é preocupante. O perigo é não conseguirmos nos isolar mais, deixar de se conectar. O isolamento não é ruim, ele é fundamental. Precisamos nos isolar de vez em quando, nos conectar com nós mesmos. Ler um livro ou ver um filme são formas de isolamento e desconexão. A plena comunicação é nefasta e o completo isolamento é também ruim. É preciso encontrar um equilíbrio.

Michel Serres em seu livro “Polegarzinha” (link) diz que as gerações passadas nunca procuraram novas formas de se relacionar, não romperam isolamento nenhum. Nossa geração é a única que tem a possibilidade de criar novos laços. Nós, polegarzinhos e polegarzinhas, estamos sempre procurando novas formas de interação com o outro, uma dessas são as redes sociais. Além disso, as tecnologias móveis estimulam velhos rituais sociais como trocas. É o caso do Instagram (aplicativo de postagem de fotografias) e outros aplicativos em que o objetivo é, muito mais, fazer contato com o outro do que compartilhar os momentos. Tiramos fotos de momentos banais, da comida, mostrando onde estamos. O importante é a circulação. “Os DHMCM [Dispositivos Híbridos Móveis de Conexão Multirrede] agem como artefatos para suporte de sociabilidade, de formas de “estar junto” (LEMOS 2007)

O que impulsionou o mercado de aplicativos foi essa necessidade de comunicar e encurtar distancias. Os primeiros aplicativos existentes surgiram para suprir essa necessidade de comunicação com o mundo e com o outro. Isso gerou um fluxo de informação muito maior. Agora, o saber está na internet, disponível. Já está transmitido. Segundo Michel Serres, isso origina outro problema: precisamos mudar a forma de educar. Não só o ensino em si, mas as instituições em geral da sociedade (política, justiça, saúde, empresas...) se tornaram ultrapassadas.

A educação como está instaurada, focada na figura de um professor que teoricamente é a fonte de todo o saber, não faz mais sentido na sociedade pós-moderna. Temos, em sala de aula, uma juventude que vê o mundo como um reservatório de saber para ser utilizado. E essa e a essência da tecnociência. Assim, geramos a necessidade de transformar tudo em dados, código binário para poder ser lido e veiculado em computadores. Sentar e ouvir o professor já não é tão interessante como era para outras gerações. Se a internet, tablets, aplicativos e os computadores forem utilizados como um mecanismo para estimular os alunos e agregar valor ao trabalho do professor sem substituí-lo, não há porque abdica-los. É assertivo, portanto, pensar a tecnologia como um recurso estratégico voltado para uma ação pedagógica diferenciada.  (Leia mais sobre as 10 tendências da tecnologia na educação)

Outra questão importante que também revela muito sobre a nossa relação com a tecnologia é a complexa discussão sobre a efemeridade tecnológica. Cada vez mais utilizamos os aparelhos tecnológicos por menos tempo, ou por que lançam modelos mais novos e somos seduzidos de tal forma que nos obrigamos a consumir sempre o ultimo modelo ou porque vivemos em uma sociedade dominada por uma economia de crescimento e a obsolescência programada da tecnologia é uma realidade. A lógica da obsolescência programada não é crescer para satisfazer necessidades, é crescer por crescer. É bem simples: para a economia crescer, é preciso que as pessoas comprem e para fazer com que as pessoas comprem, é necessário limitar o tempo de uso de cada dispositivo. Um exemplo muito claro e atual dessa obsolescência é o que gira em torno do iOS da Apple no que diz respeito às versões anteriores do iPhone que depois de determinada quantidade de atualizações simplesmente param de rodar os aplicativos.

Estamos tão acostumados com a efemeridade das coisas que acabamos tornando efêmeras a nossa relação com tudo, nunca se teve uma geração tão dinâmica como a nossa. Há um tempo, o nosso aplicativo mais usado era o Messenger (MSN), depois de um tempo o MSN se tornou arcaico, passamos para o Orkut e hoje estamos no Facebook. Tudo isso em cerca de 10 anos. Segundo Phil Libin, o fundador do Evernote (aplicativo popular de anotações) os aplicativos estarão obsoletos em breve. Para Libin, apesar de ser um sucesso, os apps não estão mais no topo quando se fala em ferramentas de comunicação. Enquanto a produtividade em um computador flui em ciclos de 2 a 3 horas, a produtividade em uma tela de celular é alcançada em espaços muito pequenos de tempo. As telas dos celulares estão ficando cada vez menores, o que prendem a atenção do usuário por mais tempo para assimilar uma informação, diminuindo o tempo de produtividade. Enquanto no computador gastamos um ou dois segundos para ver e assimilar uma informação, nos aplicativos (na configuração que conhecemos hoje) não conseguimos nem abri-lo nesse tempo. Os aplicativos são feitos para iterações breves, então vai ser cada vez mais difícil fazer com que um aplicativo consiga fazer o usuário ser produtivo em segundos. Para Libin, os wearables (tecnologias de vestir como relógios e óculos) são o futuro da tecnologia móvel.



REFERÊNCIAS


Joly, M. C. R. A. (org.) 2002. A tecnologia no ensino: implicações para a aprendizagem. São Paulo: Casa do Psicólogo, 162 p.

LEMOS, A. 2007. Dossiê André Lemos. Comunicação, mídia e consumo. São Paulo. Vol 4, n.10
Disponível em: <http://revistas.univerciencia.org/index.php/comunicacaomidiaeconsumo/article/view/5016/4640> Acesso em: 25/03/2015.

LEVY, P. “ O inexistente impacto da tecnologia” Disponível em: <https://dl.dropboxusercontent.com/u/2055897/impacto.doc> Acesso em: 22/03/2015. 

terça-feira, 24 de março de 2015

Cada louco com seu app !!

Confiram a lista de 15 aplicativos que, com certeza, são os mais inúteis já feitos para smartphones. E o campeão de inutilidade é o "iBeer", que permite ao usuário "beber cerveja" num copo virtual.



E aí, você baixaria algum deles?